O Homem Estátua, Orlando Neves Lizardo
Umas das coisas positivas da minha profissão é ter a oportunidade de conhecer pessoas verdadeiramente interessantes, que estão à minha frente não apenas para comprar uma viagem de sonho, mas também para falar. Felizmente, desde que iniciei essa profissão, já conheci pessoas que deixaram de ser clientes apenas e passaram a ser amigos.
Uma destas pessoas, é o sr. Orlando Neves Lizardo, um homem que, pelo meio da conversa profissional, mostrou-me ser um poeta e, assim, com a sua devida autorização, quero apresentar-vos um dos seus poemas: O Homem Estátua. E reza assim:
O Homem Estátua
Numa tarde com sol, na Primavera,
Andava vagueando no Chiado,
Quando vi um "Homem Estátua" no passeio
Imitando a figura de Camões.
Petreficado, imóvel, permanece.
Então, num movimento inesperado,
Desperta, estremece.
Alteando um rosto pálido, inspirado,
Começa a recitar, de cor, uns versos:
Sonorosas estâncias d'Os Lusíadas
Do seu Canto Primeiro.
Quem dera fosse eterno
Tão breve e belo instante
E nunca passageiro.
Olhando, meio cego, para mim,
Não quis saber quem sou
Essa estátua falante.
A estátua era um poeta a recitar
Nessa tarde com sol, na Primavera.
O homem mascarado ele era alguém,
Alguém que eu nunca soube quem ele era...
Em momentos dum tempo, já sem crenças,
Por vezes me convenço
Que os milagres da vida
No tormento das nossas incertezas
Nascem da fé, de sonhos, de ilusões.
E assim esse "Homem estátua", mascarado
Não sendo até julguei que era Camões.
Ó homem mascarado
Ó estátua de carne,
Com alma de poeta,
Eu vi-te, nessa tarde, no Chiado.
E se eu tiver, em mim, alguma fé,
Até direi que nessa tarde eu vi
Camões ressuscitado!
In, O Arauto de Bocage, n.º 135/136 - Março/Abril, p. 8
Ao sr. Orlando Neves Lizardo tenho de agradecer os minutos que me "roubou" e que presenteou com as suas belas palavras. O brilho dos seus olhos quando recita o poema era contagiante. A si apenas agradeço por ter trazido um pouco mais de luz e de beleza naquela minha tarde de sol, na Primavera.