A força das palavras
"A força das palavras. E como a realidade se intensifica sobretudo nelas. Olho um nascer do sol, uma pedra. Se passarem a um quadro (o nascer do sol, por exemplo, no 'Impressões' de Monet) a sua realidade é logo outra. Mas a palavra torna-os ainda mais intensos.
Uma cena erótica observada pode não ter grande interesse e dar-nos mesmo repulsa ou tédio risonho. Mas a imagem dela agrava-lhe já a sugestão ou impressão. Porque a arte sublima-a progrssivamente para o domínio do imaginário. E a imaginação é sempre mais eficaz que o real, porque lhe dá a emoção pura que ele não tem. Por isso uma mulher se purifica no impossível que o real materializa.
Assim esse real nos decepciona muitas vezes por sobrepor ao imaginário o que o limita e submete.
A transcendência da realidade começa na fotografia e termina na palavra. Porque é que ao olhares um objecto conhecido e vês a sua fotografia, olhas esta com um sentir diferente? Porque é que o real e a sua pressuposta imagem fotográfica têm de permeio algo de estranho ou surpreendente?
Há já aí uma transposição para um outro domínio em que o imaginário obscuramente se nos abre (...) Que todavia se leia o que escritor viu nesse real fotpgrafado e saberemos como a própria imagem se transfigurou. E é o que se inicia já na representação pictórica do mesmo real, por mais 'realista' que ela for.
Mas a palavra transpõe-no para um máximo de irrealização, porque é necessário reconstruí-lo ou fixá-lo no puro imaginar.
Do real à palavra vai uma distância infinita. È a que vai da bruteza ou confusão à essencialidade oculta, a que vai do ver subjectivo que lhe dá uma significação.
O real está do lado das coisas. O imaginário, do lado do homem. Mas o real não existe, se o homem o não fizer existir."
in Pensar, Vergilio Ferreira, página 77, entrada 85
Pensar, de Vergilio Ferreira - um livro já um pouco velhinho! Comprei-o em Março de 1998. Uma obra que nos faz, tal como o nome indica, pensar ... pensar muito.
O autor reflecte sobre as mais diversas temáticas da vida e do homem comum. Um livro para saborear com o passar dos anos.
È tão engraçado, após quase 10 anos da compra do livro, ver aquilo que, em 1998, foi sublinhado por mim ... coisas que, em 2007, já não têm tanto significado ou que não fazem tanto sentido ou não têm tanta importância na nossa vida.
È uma obra que, para além de nos fazer também pensar um pouco sobre as mais variadas temáticas, faz com que se faça um balanço na nossa própria vida.
Recomendo!